22 de janeiro de 2016

Luci Collin

É coisa rara hoje em dia sair um artigo sobre poesia num grande jornal. ainda mais de autoria de Luiz Costa Lima, e ainda abordando um poeta ainda não consagrado. Luci Collin mereceu este feito no caderno Ilustríssima, da Folha de S. Paulo. Fui atrás dos livros da poeta curitibana. Os dois publicados em belas edições da 7Letras. Querer falar foi finalista do Prêmio Oceanos.

É surpreendente a poesia de Luci Collin! Repercute a ambiguidade da interpretação desta época de compreensão dos inomináveis, pois tudo que se diga fica valendo. Se tudo que se nomina é compreensível, nada se compreende. Só me incomoda a forma de lidar com a lírica na poesia de Luci Collin e de mais meio mundo dos poetas atuais. Aparecem expressões diretas que devem ser abolidas. Eu não engulo mais poesia que conclua o poema jogando aberta e prosaicamente a relação dos sujeitos.

Um ótimo poema sobre o coração terminar assim "se instauraram em ensaiar/algum/outro/você" é não desejar ir muito longe. Tem um outro final que consegue ser pior: "o meu amor por você tem você". Será que o mundo está tão carente que todo poeta tem essa obrigação de jogar o "eu" abertamente no outro sem a ambição do ambíguo? E não é conveniente o uso de este, deste, esta desta, assim por todos os versos. "Este cão que me segue" não pode ser simplesmente o cão? O escritor precisa acautelar-se contra a facilidade de estar no mundo. A literatura é se desenraizar da terra em que se pisa. Tirando estas fragilidades, Luci Collin faz jus a Luiz Costa Lima.

O poeta atual só irá mais longe se tiver coragem de exigir à exaustão melhor textura de sua proposta textual. O ímpeto de dizer não é suficiente para a linguagem, como não é suficiente o lixo para a bagagem. O que é transportado tem de valer e terá de valer a bela embalagem.

Assim vale a bordadura de Luci Collin:

Quando eu vivia na casa da rua anis
os cômodos e os exemplos eram imensos
calor abatumado na água-furtada
os insetos tergiversavam
e as rãs e os sorrisos eram de cristal holoédrico.

Nem me interesso pelo significado de holoédrico, pois o poema vai se construindo numa satisfação milagrosa.

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